segunda-feira, 20 de outubro de 2014

Tanatos, é inadmissível que uma banda precise pagar para ter espaço...


É muito comum olharmos de fora do cenário Black Metal e termos uma visão completamente errada do que realmente é o estilo. Conversamos com Tanatos, vocalista e guitarrista da banda Creptum, que nos atendeu prontamente e se mostrou um cara ligado com o cenário como um todo e também deixou em claro, o que o Black Metal e sua banda, Creptum, significam para ele. Confiram

Heavy Metal Breakdown: Antes de começarmos, obrigado pelo seu tempo e por nos dar o privilégio dessa conversa. Agora, fale-nos sobre você e suas atividades.
Tanatos: Primeiramente, eu que agradeço pelo espaço e apoio. Sou vocalista, guitarrista e um dos fundadores da banda Creptum.
A ideia de criar o Creptum surgiu em 2001 junto com Animus Atra (atualmente baterista) com a amizade e afinidades na música e de ideologias que temos desde adolescente. Nessa época, escutávamos muito bandas como Slayer, Marduk, Dark Funeral, Immortal e isso fez com que crescesse uma vontade de, à nossa maneira, poder tocar e dizer coisas como eles.
Sempre estudei e trabalhei com design, isso ajudou bastante a criar uma identidade para o Creptum, não só musical, mas também estética.
Depois de gravar a demo "...make this world burn" em 2003 e com o aumento gradativo da quantidade de shows, decidi, por motivos pessoais, me afastar da banda. Assim, não só me afastei da banda, como também da cena. Deixando o Creptum nas mãos do Animus. Depois de quase nove anos sem contato direto, nos encontramos casualmente e vimos que a amizade e a ideia do Creptum, poderiam voltar com uma força ainda maior, visto nossa experiência de vida adquirida nesses anos.
Nesta nova reunião, preparada com paciência e cuidado, procuramos adotar uma nova postura (inclusive visual) para a banda, não é mais um projeto de adolescente. Estamos mais velhos e o negócio não é ser 'rockstar'. Queremos espalhar o metal negro ríspido e cru, porém com profissionalismo e maturidade. Ainda abordamos temas como ocultismo e, principalmente o desprezo aos dogmas religiosos, sabendo que isso é um assunto muito mais profundo do que simplesmente pintar a cara e dizer que vai matar todo cristão no mundo.


HMB: O que você acha de bandas que banalizam o ocultismo e a ciência negra e partem para a agressão propriamente dita? Não seria por casos como este que o público em geral tem uma visão um tanto distorcida do que o Black Metal se tornou?
Tanatos: Não acho que seja apenas uma banalização. Vejo mais como uma dificuldade de interpretar as coisas. Se você pegar uma religião de dogmas como o cristianismo, "virar de ponta cabeça" e começar a cagar regras e verdades absolutas, você faz exatamente as mesmas coisas, não há diferença. Talvez seja por isso que, uma grande parte das pessoas com a mente mais fechada tendem em abandonar o estilo e se juntar à religião. Há uma necessidade de seguir regras, e fica difícil se desvincular. Acredito que uma emancipação do ser humano seja a ideia mais próxima de um Black Metal puro.

HMB: Não é desestimulador para você, ver essa fraqueza nos seres humanos e saber que você leva a ideologia apenas aos já "convertidos"?
Tanatos: Sinceramente não. Posso tocar pra dez pessoas, isso pra mim está de bom tamanho. Se a pessoa teve algum interesse no Creptum, seja pelo som, letra ou até pela capa do disco, sei que esta pessoa tem alguma coisa em comum com nossa ideologia e isso já me deixa satisfeito.


HMB: E na sua visão, como é o cenário Black Metal, como um todo hoje?
Tanatos: Atualmente vejo com bons olhos. Apesar do que falamos anteriormente, sobre uma interpretação equivocada do estilo por algumas pessoas, o cenário nacional é muito rico.
Tendo em vista o acesso mais fácil às grandes nomes internacionais, que agora veem com mais frequência ao Brasil, o cenário nacional precisou sair um pouco do amadorismo e criar uma maturidade.
Grande parte das bandas aqui que não devem nada para as de fora. A qualidade é notada desde as gravações de alto nível e até na parte gráfica dos álbuns e demos , e sou extremamente chato com isso (risos).

HMB: E como tem sido o comparecimento do publico aos shows?
Tanatos: Vou responder pelos eventos que tenho ido, pois o Creptum voltará aos palcos somente em novembro.
Apesar da grande qualidade da maioria das bandas nacionais, não vejo uma presença efetiva do público. É claro, em alguns shows internacionais isso muda de figura, mas aí é que está à dificuldade das bandas brasileiras, a galera fala muito de apoio à cena underground, mas poucos o fazem de verdade. Gastam-se um bom dinheiro em ingressos onde no cast colocam apenas uma ou dias bandas locais e, em eventos undergrounds onde o ingresso é 10/20 reais a galera não comparece com a mesma frequência.
Como espectador, é claro que gosto de ver as bandas que nunca pensei em ver ao vivo, os que poderiam equilibrar são os produtores, dar mais espaços pra bandas novas aparecerem em vez de inflar um festival com 5 bandas gringas e uma única brasileira. Um grande exemplo positivo é o Zoombie Ritual, um festival de grandes proporções com 15 atrações internacionais, porém são quase 30 bandas nacionais. Mais eventos como este poderiam rolar por todo o país.

HMB: Será que a condições tributárias do nosso país, impede uma maior realização desse tipo de evento?
Tanatos: Nossa questão tributária é bem complicada mesmo, mas não pode ser usada como desculpa sempre.
Existe, é claro, uma dificuldade financeira em produzir um evento de qualidade, mas o interesse em fazer um festival com determinadas bandas internacionais e não equilibrar o cast com bandas daqui é escolha da organização do evento.
A questão é aproveitar a oportunidade onde é esperada a presença do público em maior número, como shows internacionais, para poder dar uma força às bandas locais.
Já cheguei a ouvir casos que há produtores cobrando para colocar bandas nacionais para abrir shows gringos. É inadmissível que uma banda precise pagar para ter espaço junto a bandas internacionais no Brasil!


HMB: Concordo com você! Como você usa a internet como ferramenta para a divulgação do seu trabalho?
Tanatos: É impossível não usar as ferramentas web. Principalmente para bandas independentes como nós.
Atualmente fazemos uso dos principais canais como: facebook, youtube, bandcamp, reverbnation, lastfm, bandsintown (que, aliás, é uma das ferramentas que considero mais interessantes para bandas atualmente), instagram e outras mais...
Até muito pouco tempo atrás, coisa de dez anos, ainda era bem difícil conseguir material de bandas independentes. De lá pra cá, essas ferramentas só fizeram ajudar na divulgação.
Recentemente li uma entrevista com o vocalista do Emperor, Ihsahn, falando que com a internet perdeu-se o mistério por trás das bandas de Black Metal, concordo que hoje o acesso aos "ídolos" ficou mais fácil, mas isso é positivo. É fácil dizer isto quando as tais bandas obscuras sempre tocaram na sua cidade. Quando adolescente comprava revistas gringas mais antigas nos sebos próximos à galeria do rock pra conhecer essas bandas. A internet trouxe isso mais próximo de nós, e como banda independente, levou o Creptum para onde eu nunca pensei que fosse chegar.

HMB: E com a facilidade de acesso, não teria o público, banalizado o acesso às informações e se acomodado, já que basta querer e estão lá, fotos, releases, CDs completos?
Tanatos: Não vejo dessa maneira. Talvez porque sempre fui daqueles que não importa se tivesse acesso à tudo de uma banda, vê-la ao vivo sempre me agradou muito mais. E não só as grandes bandas de fora.
Tenho muita amizade com o pessoal do Amazarak e o Paolo do Desdominus, por exemplo, e mesmo tendo acesso direto a eles, vê-los tocando ao vivo é sempre gratificante.
Facilitar o acesso ao que oferecemos, é um dever nosso. Não é porque em outros tempos era mais complicado e "suado" para conseguir as coisas que vou querer que uma pessoa interessada no Creptum, passe por isso. Fazemos música para ser ouvida, não importa se é em CD original, mp3 via torrent, youtube ou ao vivo.


HMB: O Creptum lançou duas demos em 2003 e 2004 e só voltou a lançar material agora em 2014, por que a demora?
Tanatos: Eu deixei o Creptum em 2004 mesmo, pouco antes da gravação da 2ª demo. A banda continuou com outra formação até meados de 2005. Após isso, o pessoal foi deixando de ensaiar até pararem de vez. Animus já estava no Carpatus e Nefus estava envolvido em outros projetos. Aí apenas em 2012, se não me engano, foi que reencontrei os dois ocasionalmente. Ali percebemos que o Creptum poderia voltar, e com a formação mais próxima da original.

HMB: E você percebeu uma evolução na cena, de 2005 para cá, ou quando voltou, sentiu que tudo ainda era igual?
Tanatos: Bom, posso dizer qu houve sim uma evolução. Principalmente quanto à quantidade e qualidade dos shows. Mas houve uma ligeira diminuição do público. Fui inúmeras vezes à Fofinho aqui em São Paulo com casa cheia, a galera dando apoio de verdade. Recentemente, em um evento lá, com bandas de altíssima qualidade e que raramente tocam em SP, porém o público deixou muito a desejar, a casa estava bem vazia.


HMB: Planos para o futuro?
Tanatos: Atualmente estou focado na volta aos palcos, que vai ocorrer em novembro com o Creptum. Já fechamos mais algumas datas e em paralelo trabalhamos em um material totalmente inédito para ser lançado no primeiro semestre de 2015.

HMB: Resuma Tanatos em uma frase ou palavra.
Tanatos: Verdadeiro. Não estou aqui de brincadeira.

HMB: Obrigado pelo seu tempo e por nos proporcionar este belo bate-papo, deixe aqui uma mensagem para os nossos leitores.
Tanatos: Gostaria de agradecer a oportunidade e o apoio que tem dado não só a mim e ao Creptum, mas à cena underground como um todo. Essas atitudes que deveriam ser mais vezes repetidas.
Peço aos leitores do HM Breakdown que participem, apoiem efetivamente a cena. Vá aos shows do seu bairro, conheça as bandas à sua volta e valorize-as.

Vida longa ao metal underground!

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